MANIFESTAÇÕES PELO MUNDO:
VIOLÊNCIA GENERALIZADA NA UCRÂNIA E VENEZUELA.
ENTENDA OS FATOS...
UCRÂNIA
Em Kiev, Ucrânia, o protesto já deixa mais de 75 mortos. |
As manifestações começaram depois que o presidente Viktor Yanukovych anunciou sua decisão de não assinar um acordo de cooperação com a União Europeia, que poderia, no futuro, ter a Ucrânia como um de seus membros.
A questão, no entanto, é mais complexa e tem raízes na história recente do país, nascido após a desintegração da ex-União Soviética. O país está no meio de uma disputa de forças entre grupos que querem mais proximidade com a União Europeia e outros que têm mais afinidade com a Rússia.
As novas leis certamente aumentaram as tensões no país. Estas leis determinam a prisão de qualquer pessoa que bloqueie a entrada de prédios públicos e também proíbem o uso de máscaras ou capacetes durante manifestações. Mas, o que desencadeou os protestos foi a decisão do presidente Viktor Yanukovych de não assinar um amplo acordo de parceria com a União Europeia, apesar de anos de negociação, para integrar a Ucrânia ao bloco de 28 países.
Milhares de ucranianos que eram a favor do acordo foram para as ruas da capital, exigindo que o presidente mudasse a decisão, mas ele se recusou e os protestos continuaram. Quando a tropa de choque entrou em ação no dia 30 de novembro, as imagens dos soldados acabando com um protesto de estudantes e deixando dezenas de feridos apenas aumentou a insatisfação com o presidente e também as multidões na Praça da Independência.
As autoridades tentaram acalmar os ânimos com medidas como a suspensão do prefeito de Kiev e a libertação dos manifestantes detidos. E no dia 17 de dezembro Rússia e Ucrânia anunciaram um acordo no qual a Rússia vai comprar US$ 15 bilhões em títulos do governo ucraniano e diminuir o preço do gás russo vendido para o país. O acordo parecia ter diminuído a tensão, mas quando uma jornalista partidária da oposição, Tetyana Chornovol, foi espancada por um grupo de desconhecidos no dia 25 de dezembro, os protestos voltaram. As novas leis de segurança foram então aprovadas no dia 16 de janeiro e começaram a ser aplicadas no dia 22.
Os manifestantes são sobretudo de Kiev e do oeste da Ucrânia, região mais pró-Europa. Do outro lado do espectro político, os pró-Rússia vivem sobretudo no leste do país, onde o russo é a língua dominante, um resquício dos tempos da União Soviética. Além da questão da integração com a Europa, acusações de corrupção contra integrantes do atual governo, pró-Rússia, também tem motivado os protestos.
Os três partidos de oposição no Parlamento se juntaram aos protestos. O ex-campeão de boxe Vitali Klitschko tornou-se uma das caras do movimento. Hoje ele é o líder do movimento Udar (soco, em ucraniano) e possível candidato à presidência em 2015. A oposição também é formada por uma novidade, os ultranacionalistas, formados após a Revolução Laranja de 2004. O partido de extrema-direita Svoboda (liberdade) é liderado por Oleh Tyahnybok .O terceiro partido também é parte da extrema-direita. O Bratstvo (irmandande) estaria por trás dos enfrentamentos com a polícia durante os protestos.
A reação da União Europeia não poderia ser diferente, afirma que as mortes dos manifestantes causaram choque e pediu que todos os envolvidos acabassem com a violência. José Manuel Durão Barroso, presidente da Comissão Europeia, afirmou que o relacionamento do bloco com a Ucrânia precisará ser revisto. A posição oficial dos europeus em relação ao acordo suspenso em novembro é que a porta continua aberta para a Ucrania, mas as negociações por enquanto estão suspensas. E a Embaixada dos Estados Unidos em Kiev cancelou os vistos de "vários ucranianos envolvidos com a violência dos últimos dias".
O presidente Yanukovych, que foi eleito democraticamente em 2010, ainda tem muito apoio no leste e sul do país, e já ocorreram manifestações de apoio ao governo nestas regiões. Ele estabeleceu uma comissão especial para se reunir com representantes da oposição mas ainda não se sabe se isto será o bastante para evitar um aumento da violência. Enquanto isso, a oposição ainda luta para encontrar um líder que consiga unir todos os partidos.
VENEZUELA
Clima de tensão aumentou após protestos estudantis que
terminaram em confronto.
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O número de feridos passa de cem, segundo as agências de notícias. As mobilizações formam parte da mais recente série de protestos de massa contra as políticas do presidente Nicolás Maduro, sucessor de Hugo Chávez.
O que começou há pouco mais de uma semana como uma manifestação estudantil contra a insegurança em vários estados do país desencadeou uma série de mobilizações às quais diversos grupos políticos e outros setores da sociedade aderiram. Inicialmente, estudantes no estado de Táchira, que exigiam maiores medidas de segurança, foram presos por desordem pública. O evento gerou outros protestos neste estado e em Mérida, que resultaram em distúrbios e mais prisões.
Originalmente, os protestos eram contra os altos índices de criminalidade. Mas problemas como a inflação, a falta de bens de consumo básicos, o mercado negro e os apagões também geraram mal-estar em alguns setores. Isso sem falar da oposição de direita, que pretende mudar 15 anos de políticas "chavistas" - iniciadas pelo ex-líder Hugo Chávez e continuadas por Nicolás Maduro.A Venezuela tem uma das taxas de homicídio mais altas do mundo. Grupos da sociedade civil denunciam a impunidade em relação aos infratores e acusam também as milícias armadas.
O país também sofre com a inflação mais alta na região - que chegou a 56,2% em 2013. Produtos básicos como leite, açúcar, medicamentos e até papel higiênico frequentemente não podem ser encontrados nos supermercados.
Estudantes pedem fim da insegurança e medidas contra inflação. Desde 2003, o governo de Chávez impôs um controle cambial às moedas estrangeiras em uma tentativa de frear a fuga de capitais e manter os preços da cesta básica. O dólar oficial vale 6,3 bolívares, mas a moeda no mercado negro vale dez vezes mais. É com base nesse mercado negro que os venezuelanos calculam o custo de vida. A isso se somam os apagões de energia que ocorrem com frequência. Dois aconteceram na capital, Caracas, em 2013, mas muitos ocorreram em outras regiões.
O presidente Nicolás Maduro condenou os incidentes da manifestação da quarta-feira passada e os atribuiu a um levante "nazifascista" que buscaria um golpe de Estado. "Não haverá golpe de Estado na Venezuela, tenham certeza absoluta, o mundo deve saber disso", declarou. Maduro pediu a paz, mas afirmou que os que participaram do episódio de violência não ficariam impunes, ao mesmo tempo em que manifestou apoio às investigações que a Promotoria Pública realizará para determinar os possíveis responsáveis.
Um dia depois, de acordo com a mídia local, o governo emitiu uma ordem de prisão contra o líder opositor Leopoldo López, que é acusado de liderar os protestos da quarta-feira. Ele também é acusado de incitação à delinquência, de intimidação pública, de danos à propriedade pública e até de homicídio doloso qualificado.
Carlos Vecchio, um dos dirigentes do partido de López, disse que a ordem de prisão "é parte de um plano para criminalizar os protestos". Ativistas estudantis também afirmaram que foram às ruas pedir por mudanças, e não provocar um golpe de Estado. "Sempre que alguém protesta por um direito, o governo sai com o discurso de que 'sofremos um golpe de Estado' ou que 'estão criando uma agenda oculta para desestabilizar'. Desestabilizada está a sociedade venezuelana que vive com medo e fazendo filas", disse a líder estudantil Arellano.
Arellano disse ainda que se o governo de Maduro não quer ver mais manifestações, deve responder às exigências dos estudantes. No entanto, a resposta às convocações por mais protestos por parte dos líderes estudantis e outros líderes da oposição foi limitada, após o episódio da quarta-feira.
Isso possivelmente se deve ao fato de que a oposição está dividida.
Os números de pessoas detidas, liberados, presas e feridas nas manifestações muda a todo momento, na medida em que se resolvem casos individuais, e também muda de acordo com as fontes. O que ninguém contesta são as três pessoas que morreram na quarta-feira passada, dia 12 de fevereiro: dois estudantes ativistas e um simpatizante do governo, dos chamados "coletivos". Os números oficiais dizem que 99 pessoas foram detidas até o domingo por suposta participação em episódios de violência ou outros delitos em Caracas e outros estados.
De acordo com o site da Promotoria Pública, a maioria destas pessoas foram libertadas depois de serem aplicadas medidas cautelares. 13 delas foram presas. No dia 13 de fevereiro, um dia depois do confronto, as autoridades diziam que o número de feridos era 66. No entanto, agências de notícias informam que já passa de 100. Por outro lado, a ONG Foro Penal Venezolano diz que 155 pessoas foram detidas, a maioria em Caracas, e que seis delas estão presas esperando a decisão dos tribunais. A ONG também menciona 22 feridos durante as manifestações, 14 deles por tiros, só no estado de Lara.
Qualquer seja a avaliação dos fatos da última semana, a Venezuela enfrenta desafios complexos e tem pela frente um longo caminho até a estabilização. Em primeiro lugar, o país está tão polarizado politicamente que qualquer atitude que o governo tome não tardará a receber uma reação contrária de igual força. O mesmo acontece com a oposição.
A situação não contribui para atacar o problema mais urgente do país: a economia. A oposição insiste que a culpa pelos problemas econômicos do país é da administração chavista, mas oficialmente se fala de uma "guerra econômica" impulsionada pelos inimigos da Revolução Bolivariana. A alta taxa de inflação e a escassez de produtos básicos ainda não foram resolvidas.
A Assembleia Nacional outorgou poderes especiais ao presidente Maduro para decretar leis que aumentem o controle estatal da economia. Entre elas está a limitação dos ganhos sobre a venda de produtos e a fixação de preços justos para o consumidor. Mas os críticos asseguram que estas medidas só aprofundarão as distorções da economia, criando mais escassez e um mercado negro descontrolado.
Fonte: BBC / Brasil